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Flagrantes preparados do Jornal Hoje levantam sérias questões éticas

Na edição do dia 04/01/2012 o Jornal Hoje da Rede Globo exibiu uma “reportagem investigativa” onde sob o pretexto de revelar “os riscos que os motoristas enfrentam”, jornalistas armaram flagrantes preparados usando câmeras escondidas e exibiram as imagens dos manobristas que caíram nas armadilhas, sem ao menos proteger suas identidades, levantando sérias questões sobre a legitimidade e os limites éticos do jornalismo da maior emissora de televisão da América Latina.

A reportagem “Câmera do JH flagra manobristas vasculhando carros em São Paulo” apresentada por Evaristo Costa como “debate sobre os riscos que motoristas correm nas grandes cidades” e por Sandra Annenberg como “mostra do trabalho dos manobristas” são flagrantes preparados pelos jornalistas Walace Lara, William Santos, Robinson Cerântula, Carlos Rodrigues Junior, Juvenal Vieira e Patricia Marques, sob editoria de Teresa Garcia e Paulo Amaral. Devido aos métodos utilizados na reportagem, suponho que tenha sido aprovada pelos diretores de jornalismo da emissora Carlos Henrique Schroder e Ali Kamel.

Para preparar o flagrante os jornalistas colocaram deliberadamente no interior dos carros grandes valores em moedas e até doces como “tentação” (palavra usada na reportagem) para provocar e induzir os manobristas a um comportamento delituoso. Criaram um cenário artificial tentador que não corresponde à expectativa de um veículo comum que utiliza os serviços de estacionamento nas grande cidades, um cenário de causar tanto estranhamento que durante a reportagem os manobristas flagrados exclamam: “essa eu nunca vi não”; se espantam: “o carro aqui parece uma doceria”; e desconfiam: “tem câmera? têm ou não têm?”.

O documento com os Princípios Editoriais das Organizações Globo diz o seguinte sobre o uso de câmeras escondidas, na seção II, ítem 2/J:
“O uso de microcâmeras e gravadores escondidos, visando à publicação de reportagens, é legítimo se este for o único método capaz de registrar condutas ilícitas, criminosas ou contrárias ao interesse público. Deve ser feito com parcimônia, e em casos de gravidade.”
É flagrante que faltou “parcimônia” na escolha do método, visto que a informação sobre o risco de furto em estacionamentos poderia ter sido apresentada utilizando-se de outros métodos legítimos, porém, com certeza menos sensacionais. O delito flagrado pelas câmeras no cenário preparado pelos jornalistas – furtar moedas ou doces – não é um “caso de gravidade”, um juiz de direito aplicaria o princípio da insignificância em todos os casos retratados pela reportagem. Ademais, se o flagrante foi preparado não houve crime, houve um “delito putativo por obra de um agente provocador“. O flagrante preparado ou flagrante provocado – o estímulo de uma pessoa a outra para que esta pratique o ato típico de uma infração penal, com o intuito, porém, de surpreendê-la no momento da execução – é ilegal segundo a súmula no.145 do STF

“não há crime quando o fato é preparado mediante provocação ou induzimento, direto ou por concurso, de autoridade, que o faz para fim de aprontar ou arranjar o flagrante (STF, RTJ, 98/136).”

O debate sobre câmeras escondidas, flagrantes preparados e ética jornalistica não é novo. Em 1997 nos EUA a rede de televisão ABC foi condenada a pagar mais de 5 milhões de dólares em danos por causa de uma reportagem do programa Primetime Live que supostamente revelava a presença de produtos estragados em uma corporação do ramo alimentício. A RTDNA (Radio Television Digital News Association) recomenda uma lista de seis critérios objetivos criados pela “Society of Professional Journalists” na análise da justificativa do uso de câmera escondida em uma reportagem. Para ser um ato justificável é preciso preencher todos os seis requisitos expressos. A reportagem do Jornal Hoje não preenche nenhum.
O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros da Federação Nacional dos Jornalistas diz o seguinte:
Art. 6. É dever do jornalista:
VIII – respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão;  (…)
X – defender os princípios constitucionais e legais, base do estado democrático de direito; 
Art. 11. O jornalista não pode divulgar informações:   (…)
II – de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e acidentes;
III – obtidas de maneira inadequada, por exemplo, com o uso de identidades falsas, câmeras escondidas ou microfones ocultos, salvo em casos de incontestável interesse público e quando esgotadas todas as outras possibilidades de apuração; 
Como não há crime na conduta dos manobristas retratados nos vídeos, e os jornalistas que prepararam o flagrante não podem ser considerados vítimas de subtração de coisa móvel, então as únicas vítimas acabam sendo os próprios manobristas. Vítimas de um golpe sensacionalista em busca de audiência, vítimas do que poderia ser considerado – em tese, pois não há lei de imprensa no Brasil – uma reportagem criminosa. No mínimo é uma conduta antiética pela visão do senso comum da sociedade e da comunidade profissional do jornalismo. E a identificação dos manobristas era uma informação irrelevante para o interesse público, poderia ter sido protegida pelos editores “pixelando” ou “esfumaçando” as faces dos envolvidos, mas os editores optaram por mostrar os rostos das vítimas de sua pegadinha séria com trilha de suspense.

Proteger o anonimato dos manobristas seria o respeito mínimo ao direito de imagem dos envolvidos, frente a natureza predatória dos métodos utilizados para colocá-los como objeto dos vídeos e pela  irrelevância de sua identificação na comunicação da narrativa. Pouparia dezenas de cidadãos – não só os manobristas, mas sua família, seus colegas e amigos – de sofrimentos desnecessários para contar a história. Porém, nem a imagem e nem a honra dos manobristas foi protegida, apenas as identidades corporativas das empresas onde os supostos furtos aconteceram. Não é por acaso. Corporações poderiam arrancar milhões da Globo em processos por danos morais, manobristas pobres – e provavelmente agora desempregados e envergonhados – terão muito mais dificuldade de acionar o judiciário e numa terra sem lei de imprensa, devem se contentar com as moedas e chocolates que subtraíram na fatídica pegadinha. Torço para que os manobristas brasileiros sejam organizados o suficiente para procurar a reparação dos prejudicados pela reportagem irresponsável, que mancha toda uma categoria profissional.

E cuide-se, leitor, pois a próxima vítima pode ser você ou alguém de sua família ou círculo social. Com a reportagem dos manobristas e o anúncio da série Câmera do JH, a Globo deixa claro que não respeitará a imagem de ninguém, e não abdicará de métodos questionáveis para flagrar pequenos delitos cotidianos em vídeo. Os jornalistas, que escondem seus rostos ao som de música de suspense preparando seus flagrantes,  para expor o rosto alheio em busca de um momento sensacional delituoso, parecem anunciar em tom de ameaça na página do projeto Câmera do JH: “A câmera do JH quer chegar bem pertinho de você” e “Fique ligado no Jornal Hoje, porque em 2012, o nosso foco está em você.” Qualquer incauto pode ser o próximo vilão do Big Brother jornalístico da hora do almoço. E não estranhe se forem trabalhadores jovens e pobres  induzidos a cometer pequenos delitos à serviço do espetáculo trágico, são as mesmas vítimas de sempre. A câmera escondida continuará sendo um “aparato tecnológico usado como ‘muleta’, pequenos instrumentos com poderosos recursos, que se voltam para retratar, na maioria das vezes, delitos banais, conseqüências, quando deveriam revelar causas.”
O Código de Ética dos Jornalistas não é cumprido no Brasil. Os princípios editoriais da Globo não são cumpridos pela Globo. Não foram cumpridos nem na mesma edição do Jornal Nacional em que foram anunciados com pompa, no caso da merendeira acusada de colocar veneno em comida de escola, quando a repercussão de um vídeo viral do Blog do Mello inspirado num artigo do Roteiro de Cinema obrigou William Bonner a admitir o erro e culpar uma “falha de edição” pelo deslize.  É sintomático que as vítimas dos deslizes éticos mais flagrantes da Globo sejam merendeiras e manobristas pobres. São a face mais desprotegida da sociedade.

Não há uma auto-regulamentação efetiva, nenhum ordenamento jurídico para proteger o indivíduo contra o abuso do imenso poder social dos veículos de comunicação. No legislativo está parado um projeto de lei do Senador Roberto Requião que regulamenta o direito de resposta e na gaveta do Ministro Paulo Bernardo adormece o projeto de marco regulatório das comunicações. É preciso urgentemente reabrir o debate sobre a regulamentação dos meios de comunicação de massa, sabotado pelas empresas de comunicação que gritam censura e sem nem cumprir suas próprias regras privadas tentam inibir qualquer discussão sobre regras públicas e balanceadas que visem preencher o vácuo jurídico deixado pela queda da velha e inconstitucional – segundo o STF – lei de imprensa. Uma legislação baseada na Constituição de 88, algo que proteja a liberdade de imprensa dos grandes conglomerados de mídia, as corporações privadas, mas que também nos proteja, meros cidadãos, dos abusos cometidos por elas. Alguém tem que vigiar o grande irmão que nos vigia. E vice-versa.

Fernando Marés de Souza

Algumas opiniões dos leitores que assistiram a matéria e compartilharam de minhas impressões na ocasião.

https://twitter.com/#!/DIVITTAOFFICIAL
https://twitter.com/#!/blogsessao

Anonymous não esquece e não perdoa:

Mensagem deixada por  um anônimo que hackeou a conta de Arnaldo Jabor em 2011.

FREEDOM TO THE PEOPLE & REGULATIONS TO CORPORATIONS
#OccupyMainstreamMedia #j17

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Internauta discute com Jornalista e vira a notícia

A rede de intrigas na gritaria e no silêncio da imprensa sobre a Privataria Tucana, ou Internauta discute com Jornalista e vira a notícia, por Fernando Marés de Souza

Por acompanhar pelas redes sociais o jornalista Antônio Luiz Costa – altamente recomendo para quem gosta de cultura SciFi e política nacional e internacional – acabei recebendo uma notícia muito curiosa que reflete a transformação por que passa a comunicação social.

“Notícia do portal  Comunique-se: Colunista da Veja.com discute
com internauta que perguntou se ele iria defender José Serra”.

A primeira curiosidade é que descobri – olha que coincidência – que o “internauta” em questão sou eu. Li com surpresa meu nome completo e por extenso na matéria. Fiz uma pergunta a um colunista da Veja, Ricardo Setti, e de repente isso virou notícia no Portal Comunique-se. Tempos interessantes para a comunicação. O jornalista Anderson Scardoelli conta o seguinte:
“Primeiro a criticar a atitude de Setti em divulgar a nota assinada por FHC, Fernando Marés de Souza fez questionamentos – aparentemente irônicos –ao colunista do site da Veja. “Leu o livro Ricardo? Vai defender o Serra? Interessante notar que “infâmia” não é mentira”, perguntou. Não intimidado, o jornalista não só aprovou o comentário com respondeu, como afirmou que a própria revista serviu de matéria-prima para o livro de Ribeiro Jr. “De onde você tirou a ideia de que vou “defender” Serra? Não trabalho para ele. Se há algo de que se defender, cabe a ele. Não sei se você sabe, mas o principal do livro saiu em Veja em 2005”, rebateu Setti.”
O internauta em questão então gostaria de esclarecer aos leitores do Comunique-se o seguinte:
A interpretação de que “critiquei a atitude de Setti em divulgar a nota assinada por FHC” é equivocada. Foi através da atitude do jornalista que tomei conhecimento da nota, então ao invés de “criticar a publicação” eu agradeço a informação. Setti costuma sempre responder minhas perguntas, só por isso comento em seu blog, senão nem perderia meu tempo. Não considerei sua resposta desrespeitosa e nem imaginava que nossa troca de mensagens fosse digna de nota. Ainda mais frente a reação de outros jornalistas que – coincidentemente ou não – trocaram farpas com seus leitores por causa desse mesmo tema recentemente.
Ao contrário de outros articulistas de Veja – com quem não não perco tempo discutindo – o blog de Setti não tem a “infâmia” de censurar comentários ou de se “intimidar” com perguntas. A verdade é que Ricardo Setti discute sempre com os internautas. Comigo a discussão é geralmente é boa. Então é uma boa notícia. A notícia podia ser melhor se tivesse um link pra fonte, o post original do Setti. Para que o “internauta” pudesse ir lá conferir em loco. Fica a dica. Discutiria isso diretamente com o Jornalista, mas o portal Comunique-se pede cadastro – e até CPF – para que o internauta em questão possa comentar na matéria.
A segunda curiosidade é que não foi a primeira notícia que eu li esta semana sobre jornalistas da “grande imprensa” discutindo de forma que pode ser considerada agressiva com seus leitores em blogs e redes sociais, justamente por causa do tratamento que esta “grande imprensa” deu ao lançamento do livro Privataria Tucana, ou silenciando ou tentado desqualificar o autor, o “infame” jornalista Amaury Ribeiro Jr.
O Brasil247, veículo criado para a mídia digital, publicou um artigo sobre o fenômeno, Silêncio da privataria: quando a imprensa se cala, e num ato em que parece querer comprovar que é “pautado” por seus leitores e vê isso com bons olhos, admite publicamente que o artigo foi sugestão de “internautas”, e – olha que coincidência – outra vez “internauta” em questão sou eu.
No artigo que diz ter sido sugerido por mim, o jornalista Daniel Iraheta relata episódios em que Dora Kramer, Ricardo Noblat e Kennedy Alencar – jornalistas do Estadão, Globo e Folha respectivamente – se engalfinharam publicamente com seus leitores: “Nunca escrevi ou comentei sob chicote de patrão, de fonte ou de leitor/telespectador/ouvinte/internauta. Não farei agora”, tuitou o jornalista Kennedy Alencar. “Façamos o seguinte: matriculem-se na faculdade de jornalismo, trabalhem 30 anos no ramo e aí a gente discute, ok?”, disse Dora Kramer.
Iraheta  acha que a atitude dos jornalistas citados revela a desconexão com as mídias digitais: “Que mal há se os seguidores exigem uma posição daqueles que consideram analistas políticos de referência sobre um fato político relevante? Esse é o mais claro indicativo de interesse público – o principal combustível do jornalismo.”  A conclusão do artigo que “sugeri” coincidentemente é muito parecida com o que penso:
Por meio das redes sociais, o jornalismo está se tornando cada vez mais horizontal. Sim, os leitores mandam, mas não precisam ser encarados como capatazes. É o interesse público em tempo real tuitando e cutucando. E não chicoteando!
O modelo top-down, a que Folha, Estadão e afins estão acostumados, não se encaixa na rotina produtiva de notícias atual. Hoje, quem decide o que é notícia não é só a empresa de comunicação, o colunista, a fonte. É o leitor – ativo, questionador, em contato permanente com o jornalista pela internet.
Esse leitor não precisa ingressar na escola de jornalismo hoje para aprender a discutir com colunistas. São os jornalistas de hoje que precisam entender que o modelo de 30 anos atrás ficou lá no passado. Mesmo!
Talvez não seja coincidência, e o fato de eu acabar sendo sempre “o internauta” em questão seja um mero sintoma do fenômeno desse “jornalismo em transformação” onde quem pauta a imprensa é o leitor. A terceira curiosidade é que quando eu – que não sou jornalista e sim roteirista – publiquei no começo deste ano um artigo no Roteiro de Cinema onde – just for the lulz – desmenti grande parte da imprensa brasileira que havia publicado o factóide que o “Brasil é recordista de notícias censuradas no Google”, tanto o portal Comunique-se quanto Ricardo Setti – olha que coincidência – são citados por mim entre acusados de cometer uma grave incorreção jornalística. Uma barrigada assumida com constragimento pelo Estadão e pela Abraji. Observem então, empiricamente, a diferença de conduta entre Setti e o portal Comunique-se quanto a correção da informação falsa e o compromisso com seus leitores:
“Ricardo Setti apurou, e com muita dignidade admitiu o erro e publicou  esclarecimento em seu blog e em seu Twitter, inclusive citando informações do Roteiro de Cinema e provendo um link para cá.” escrevi em meu artigo.
E como agiu o portal Comunique-se? Em flagrante desrespeito aos seus leitores, simplesmente apagou a matéria como se nunca  tivesse publicado a informação incorreta. Tentou empurrar o “lixo” pra baixo do tapete ao invés de admitir o erro e corrigir a informação.
A matéria original ainda pode ser acessada pelo cachê do Google. Nos comentários da página deletada pode-se claramente ver os leitores do portal Comunique-se “discutindo” com o jornalista que publicou a matéria. O que aliás poderia até render uma nova matéria para o portal Comunique-se, que afinal cobre os bastidores do jornalismo e da comunicação: “Internauta discute com jornalista do portal Comunique-se”.
O  professor Antonio Meira da Rocha foi o primeiro a criticar a atitude do Comunique-se: “Campanha de propaganda fajuta contra o Brasil. Leia mais sobre a suposta censura” escreveu o internauta,  indicando um link para um artigo de um blog – Roteiro de Cinema – que contradizia a informação apresentada.  Intimidado pelo leitor que contestava a veracidade dos fatos apresentados pelo veículo, o jornalista do portal Comunique-se simplesmente apagou a matéria. E nunca publicou a correção.  
Não é coincidência. É uma espécie de “karma cibernético”. O “internauta” – não o em questão, mas sua representação ideal – é a superconsciência da internet. O “internauta” nunca esquece. E também nunca perdoa. Essa legião anônima é hoje a principal força transformadora do mundo.
O embate de “internautas” contra a “velha grande imprensa” no episódio do lançamento do livro do Amaury é apenas mais um capítulo do processo histórico de transformação por que passa o jornalismo.  Um outro momento emblemático deste processo  foi o lançamento dos Princípios Editorias da Rede Globo. De maneira muito curiosa, um vídeo simples e contundente editado pelo jornalista Antônio Mello – demonstrando que o Jornal Nacional descumpriu seus princípios editoriais  na mesma edição em o anunciava com pompa –  repercutiu tanto nas redes sociais que William Bonner – constrangido por seus espectadores que enviaram o vídeo para seu perfil no twitter – teve que se retratar na edição seguinte.

Antônio Mello disse que teve a ideia de fazer o vídeo quando leu  um texto – olha que coincidência – publicado no Roteiro de Cinema e escrito por mim, onde usava o tratamento dado a uma merendeira suspeita de um crime para exemplificar o jornalismo irresponsável praticado pelo Jornal Nacional, que não respeitava a presunção de inocência e o contraditório.O exemplo em questão foi o caso de uma merendeira do RS, mas bem que poderia ter sido a o caso de Amaury Ribeiro Junior.
William Bonner disse em 2010 no Jornal Nacional que Amaury  “pagou por informações” “obtidas de forma ilegal”, e em reportagem condenatória, Cesar Tralli apresentou uma testemunha exlcusiva que incrimina Amaury, e termina afirmando que “é dado como certo o indiciamento de Amaury pela polícia.” Só depois de acusado, julgado e condenado pela Globo, pela Folha, Veja e Estadão, que o jornalista foi indiciado pela Polícia Federal. A versão de Amaury – que jura ser inocente de qualquer ilegalidade – sempre foi silenciada pelos barões da mídia.
É reveladora a cobertura do caso feito na época pelo Jornal da Globo de William Waack – jornalista acusado por “internautas” de ser “pau mandado da CIA” por ter sido flagrado passando informações ao embaixador americano em cabo confidencial vazado pelo Wikileaks. Em fala que deve entrar para os anais da história do jornalismo, o jornalista Heraldo Pereira diz o seguinte:
“E pensar que tem espírito de porco querendo limitar o acesso à livre informação, a liberdade de imprensa. Pois foi o trabalho da reportagem, tanto da Folha quanto da Globo, como vimos com Cesar Tralli, que desvendou a história da quebra ilegal de sigilo. E ninguém é capaz de acreditar facilmente que setores do PSDB – leia-se Aécio Neves, que nega veementemente – poderiam estar envolvidos nessa história de “guerra tucana” como setores do PT tentam emplacar. Isso não cola. Parece até história pra boi dormir”. 
A então candidata Dilma Roussef aparece no final da reportagem rebatendo a emissora: “O próprio jornalista em depoimento à policia federal – que eu li na internet – diz que ele fez o trabalho entre um conflito entre dois candidatos a presidência tucanos. Esconder isso é de fato tentar colocar algo que a minha campanha vem negando desde o princípio. Nós não quebramos sigilos fiscal e não fizemos dossiês”. Heraldo Pereira volta para concluir vaticinando: “Uma coisa é certa, essa história ainda pode render muito. Aguardem os próximos capítulos, meus amigos”.
A eleição passou e só agora o “próximo capítulo” foi escrito. E por Amaury Ribeiro Jr. E afinal parece se confirmar a versão sempre consistente de Amaury, essa mesma relatada por Dilma. Com o passar do tempo foi justamente a história de Amaury a que “colou”. Aquela que supostamente foi desvendada pela Folha e pela Globo é que “não emplacou”, que virou “história para boi dormir”. Mas Heraldo finge que a conclusão do escândalo não é mais com ele e também silencia. A conversa de William Waack com o embaixador americano revelada pelo Wikileaks era justamente sobre a rivalidade entre Aécio e Serra, e as tensões que estariam “dividindo o partido” tucano na definição de quem disputaria a eleição contra a canditada do presidente Lula, informações que corroboram ainda mais a versão de Amaury.

Equivoca-se quem pensa que Amaury e seu livro estão a serviço do PT ou do governo. O PT também é alvo do livro e é ameaçado pelo movimento que o livro causou. Não é por outra que líder de Dilma no congresso, Cândido Vaccarezza já disse que governo petista não quer a CPI da Privataria. Dilma também não quer. Lula em seu primeiro discurso como presidente – num prenúncio do que viria – disse que não olharia pelo retrovisor, que não iria atrás dos corruptos da gestação anterior. Começou ali o cozido que culminou no acordão da CPI do Banestado. Empurrou-se para debaixo do tapete os documentos da maior lavanderia da história da corrupção mundial. Até o concreto armado do prédio do congresso sabe que as contas CC5 foram usadas tanto por tucanos quanto petistas – e peemedebistas, pefelistas, banqueiros, empresários etc – para lavar o dinheiro sujo da corrupção, dos caixas dois e das sobras de campanha.

Na esteira da publicação do livro  foram poucos  jornalistas que trabalham para a “velha imprensa” que ousaram tocar no assunto. Na maioria das vezes, esses colegas e patrões que outrora apresentavam Amaury com sua coleção de prêmios Esso e Vladmir Herzog, agora usam o indiciamento pela polícia – que aconteceu justamente por pressão da imprensa – para desqualificá-lo. E numa espetacular ironia, é Amaury que acaba sendo acusado, por um  ex-presidente da república, de promover “assassinatos morais de inocentes.”
O que FHC diz de Amaury é irrelevante. Para Amaury – e sua “moral assassinada” pela máquina de moer reputações da grande imprensa –  não faz diferença carregar mais uma “infâmia”. Amaury confia na história e  entende o papel do “internauta”. Reconhece que foi ele o responsável por romper o bloqueio midiático e colocar sua reportagem na pauta nacional novamente. E a “grande imprensa” não se livrará tão fácil do fantasma de Amaury.

Com a exceção do Blog do Noblat – que em geral desqualificou Amaury e repercutiu a defesa dos tucanos –  fez-se uma semana de silêncio absoluto sobre o assunto nas Organizações Globo. Na internet, no jornal e na TV ignoram o livro, as denúncias contidas nele, as declarações de FHC e Serra, a anunciada CPI da Privataria do deputado Protógenes, ou qualquer coisa relacionada ao tema. Mas é só questão de tempo. Não é mais possível conter a realidade. Uma hora o William Bonner terá que pronunciar o termo “privataria” em rede nacional. Dá até pra acreditar que o apresentador um dia volte a citar o nome “Amaury Ribeiro Jr” no jornal que apresenta, como teve que voltar a falar da merendeira. Talvez isso dependa só do “internauta”, que hoje pode discutir isso diretamente com o jornalista em questão. Contestá-lo, informá-lo, pautá-lo, e até constrangê-lo.

O veterano jornalista Ricardo Kotsho coloca o dedo na ferida de seus colegas. O tratamento dado ao livro de Amaury seria o “exemplo mais descarado de manipulação da informação e do tratamento seletivo das denúncias do “jornalismo investigativo” da velha imprensa”. Pergunta Kotsho aos seus leitores:
“Para quê e para quem, afinal, serve esta liberdade de imprensa pela qual todos nós lutamos durante os tempos da ditadura, que eles apoiaram, e hoje é propriedade privada de meia dúzia de barões da mídia que decidem o que devemos ou não saber? As respostas, por favor, podem ser enviadas aqui para a área de comentários do Balaio.”

O convite para que seus leitores “discutam” com ele na “caixa de comentários” de seu blog pode se transformar em matéria penosa. Apesar da liberdade que tem como jornalista do Grupo Record – para falar do caso de Amaury e da Privataria Tucana, além de outros assuntos espinhosos que provocam o silêncio sepulcral nas redações, como a corrupção de Ricardo de Teixeira –  não deve ser fácil justificar para seus leitores a sua própria “indignação seletiva”. Kotsho obviamente silencia quando as denúncias são aquelas que pesam contra a própria Record, emissora para qual trabalha e que é acusada pelo MPF de ter sido comprada com dinheiro lavado em paraísos fiscais pelo bispo Edir Macedo, seu patrão, usando os mesmo métodos de internação em off-shores praticados por Ricardo Teixeira e pelos privatas tucanos, em transações tão brilhantemente descritas por Amaury em seu livro.

Paulo Henrique Amorim, outro funcionário da Record e um dos grandes divulgadores do livro de Amaury, assim como os jornalistas que vem criticando nesse caso, também costuma recorrer a simples desqualificação dos autores de acusações. Se ficar acuado pelas acusações contra o dono da Record feitas na matéria de Cláudio Tognolli para Brasil247, PHA pode muito bem dizer, como já disse antes – que o autor não merece credibilidade por ser supostamente biógrafo de Daniel Dantas e fonte dos arapongas da Kroll, enquanto o editor do Brasil247, Leonardo Attuch, pode ser desqualificado apenas lembrando que é o único jornalista na historia recente que teve uma operação da polícia federal criada especialmente para investigar sua atividade jornalística. Na desqualificação de Attuch, PHA faz coro com Mino Carta – que deu a primeira capa de revista ao livro de Amaury – e com a Veja, que um classificou Attuch como “negociante de notícias”, “quadrilheiro que deve satisfações à polícia”, autor de um “panfleto ignominioso”, “novelista” e “profissional à venda”, quando a revista tentou desqualificá-lo ao invés de refutar as acusações que Attuch fez contra o dono da Editora Abril, Roberto Civita, e vários jornalistas da Veja em seu livro “A CPI que abalou o Brasil – os segredos do PT e os bastidores da imprensa”.. Interessante que quando se atacam entre si na tentativa de desqualificação de um autor de denúncias que não os agradam, todos soam iguais. Todos são ao mesmo tempo vítimas e perpetradores dos mesmos crimes de imprensa.

No livro de Amaury, apesar do foco ser na Privataria Tucana de Ricardo Sérgio e da família de José Serra, o autor relata dezenas de episódios de lavagem de dinheiro por notórios personagens brasileiros: Maluf, Lalau,  Dantas, Jorgina, Marcos Valério, e Ricardo Teixeira entre outros. É sintomático – e até compreensível – que o único caso notório de lavagem de dinheiro que acabou ficando de fora do livro seja justamente aquele que diz respeito – olha que coincidência – ao atual patrão de Amaury Ribeiro Junior, que hoje também  cumpre expediente na Record de Edir Macedo. Todo jornalista acaba tendo o rabo preso afinal, nem que seja em uma situação momentânea. No final, o “internauta” é o único isento.

O importante é que a era do espiral do silêncio está acabando. E o “agenda setting” agora quem faz sou eu. Aliás, nós. A quem chamam de “internauta”. A velha grande imprensa terá que se adaptar, ou – como até seria melhor em alguns casos – irá desaparecer por falta de credibilidade. Ao ficar muito exposta à luz. Ou soterradas pela montanha de lixo que criaram e não conseguem mais esconder.

Fernando Marés de Souza é “internauta”.  

PS: O Blog do Noblat – olha que coincidência – nunca corrigiu as informações incorretas sobre a suposta censura de notícias no Google. Já “discuti” com ele sobre isso e me respondeu apenas que a matéria não é dele, é do Estadão. Como se eu não soubesse. E como se ele não fosse responsável pela correção das informações que publica em seu blog. O cara que em 2000 publicou um “ERRAMOS” na capa do jornal Correio Braziliense.

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Anonymous: Os princípios editoriais da Globo não valem o que o gato enterra



“Os princípios editoriais da Globo não valem o que o gato enterra.”
Mensagem de um Anonymous deixada no perfil crackeado do Arnaldo Jabor. https://twitter.com/#!/realjabor/status/104421995994824704 
A mensagem – que reflete o inconsciente coletivo cibernético – é obra de um coletivo chamado “Script Kiddies”, adolescentes ingleses usando tradutor automático movidos “just for the lulz”.



O termo “Arnaldo Jabor” está sendo um dos mais discutidos na rede social chegando aos “trending topics” do Twitter na manhã de hoje, mas foi rapidamente suprimido da lista pela empresa, que costuma censurar este tipo de informação dinâmica quando ela desagrada os seus interesses ou de parceiros.

http://twitter.com/#!/NosTTs/status/104546133145174016

E quem vai romper o espiral do silêncio?

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Jornal Nacional da Globo viola os Direitos Humanos

Publiquei ontem sobre os princípios editoriais das Organizações Globo anunciados e desrespeitados por seus jornalistas numa mesma edição do Jornal Nacional, e inspirado pelo relato que fiz do caso da merendeira suspeita de colocar veneno em comida de alunos, o Antônio Mello, do Blog do Mello, montou este vídeo elucidativo:

Relatei no artigo original: “Em uma matéria sobre a presença de veneno em merenda escolar no RS, a âncora Fátima Bernardes afirma: “Está foragida a merendeira que pôs veneno de rato na comida de crianças e professores de uma escola pública de Porto Alegre” – enquanto mostra a foto da acusada na tela. Mas como pode a jornalista afirmar como fato algo que ainda não foi comprovado? A merendeira é SUSPEITA de ter colocado veneno, ACUSADA de ter colocado veneno, Fátima Bernardes não pode apresentar como fato que a “merendeira pôs veneno de rato na comida de crianças”. Mesmo que haja uma suposta confissão da merendeira, o advogado da acusada afirma que ela não colocou veneno algum e que se apresentará segunda-feira, informação que o Jornal Nacional não traz em sua reportagem. A matéria fere os princípios descritos nos itens 1-v, 1-x, e 1-z dos princípios editoriais, desrespeita o princípio do contraditório e qualquer senso básico de justiça.”

Porém, mais grave que desrespeitar seus princípios editoriais, os jornalistas responsáveis pela matéria – em especial o editor-chefe William Bonner e o diretor da central de jornalismo Ali Kamel – violam os direitos humanos da cidadã brasileira Wanuzi Mendes Machado, violam a Constituição Federal e o Código de Ética dos Jornalistas brasileiros:

É expresso na Declaração Universal dos Direitos do Homem em seu artigo Artigo XI:

1. Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.  

É expresso na Constituição Federal em seu artigo Art. 5º:

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

É expresso no Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros no Capítulo III:

Art 9º A presunção de inocência é um dos fundamentos da atividade jornalística. 

Art. 12. O jornalista deve:
I – (…) ouvir sempre, antes da divulgação dos fatos, o maior número de pessoas e instituições envolvidas em uma cobertura jornalística, principalmente aquelas que são objeto de acusações não suficientemente demonstradas ou verificadas; 

Então fica a pergunta: até quando o Jornal Nacional e o jornalismo da Globo se sentirão acima de todas as regras, sejam elas públicas ou  privadas?

Vale ressaltar que não está em discussão a inocência ou culpa da cidadã Wanusi, pois isso só será determinado após o devido processo legal. Não é uma questão sobre este caso específico. É uma questão de princípios.

OUTRO LADO:

A Central Globo de Comunicação foi procurada mas ainda não se pronunciou. A resposta será publicada aqui neste espaço.

UPDATE: Apesar de ainda não ter recebido resposta da CGCOM, a edição de hoje do Jornal Nacional trouxe um desdobramento sobre o caso. Os jornalistas deram voz ao contraditório, apresentaram a tese do advogado da merendeira, passaram a chamá-la de “suspeita” e ao final, fizeram uma retratação: “Ao tratar desse caso policial no último sábado (6), por uma falha de edição, o Jornal Nacional não mencionou a alegação do advogado de defesa que contestava a confissão da cliente. Foi, obviamente uma falha, que foi corrigida nesta reportagem.”

Porém, apesar da retratação ser um avanço – apresentando o contraditório e admitindo um erro – o veículo ainda não admitiu que errou ao afirmar que a merendeira “pôs veneno de rato na comida de crianças” sem que esta tese estivesse comprovada.

Fernando Marés de Souza

PS.

FREE BRADLEY MANNING
FREE THE WEST MEMPHIS THREE
Remember José Cleves

E aí Tio? Problem?

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Organizações Globo publicam seus princípios éticos mas não os praticam

UPDATE: Depois da repercussão do vídeo que o Blog do Mello editou baseado nas informações deste artigo, na edição do Jornal Nacional do dia 08/08/2011 William Bonner pediu desculpas e reconheceu o erro ao não apresentar o contraditório no caso da “merendeira do RS”.

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Horas antes de ter ser obrigado a pedir desculpas em rede nacional.
https://twitter.com/realwbonner/status/100710116088745984

As Organizações Globo publicaram com alarde em todos os seus veículos um documento onde delineiam os “os princípios e os valores que regem o jornalismo feito por suas empresas de comunicação”.


O documento foi recebido com ironia, ceticismo e críticas nas redes sociais, alcançando rapidamente os “trending topics” do Twitter.

Blogueiros especulam que a divulgação do documento veio em resposta às acusações do jornalista Rodrigo Vianna – ex-funcionário da Globo – de que a direção da emissora emitiu ordem expressa para que seus jornalistas atacassem o novo Ministro da Defesa Celso Amorim. 

O ceticismo e as críticas são baseadas no histórico do conglomerado de mídia, e a ira e ironia dos internautas é pautada principalmente pela eterna proteção ao presidente da CBF Ricardo Teixeira – através do conhecido espiral do silêncio – que acusado de corrupção pela BBC inglesa, desdenhou dos veículos que repercutiram a notícia afirmando que só ficaria preocupado “quando sair no Jornal Nacional”. Obviamente o Jornal Nacional nunca mencionou as acusações. O silêncio da organização sobre as denúncias contra Teixeira pode ser conferido com uma simples busca aos termos “CBF + corrupção + Ricardo Teixeira” no portal de informações do conglomerado.

As ligações de Teixeira com a Globo são estreitas e antigas e as críticas ao monopólio exercido pela Globo na transmissão do futebol brasileiro recorrentes, porém recentemente uma nova denúncia grave surgiu: as Organizações Globo receberam 30 milhões de recursos públicos dos cofres da Prefeitura e do Governo do Rio através de sua subsidiária Geo Eventos para organizar o sorteio das preliminares da Copa mês passado. A escolha da empresa foi feita pelo Comitê Organizador Local, presidido por – surpresa! – Ricardo Teixeira.

Com interesses econômicos diretos na Copa do Mundo do Brasil, o jornalismo da Globo também faz vista grossa para as crescentes denúncias de violação de direitos humanos e ilegalidades cometidas na remoção de famílias para construção de infra-estrutura do evento, relatadas inclusive pela ONU.


É interessante notar que na mesma edição do Jornal Nacional que anunciou os tais Princípios Editoriais, seus jornalistas descumprem flagrantemente o que está escrito no documento. Em uma matéria sobre a presença de veneno em merenda escolar no RS, a âncora Fátima Bernardes afirma: “Está foragida a merendeira que pôs veneno de rato na comida de crianças e professores de uma escola pública de Porto Alegre” – enquanto mostra a foto da acusada na tela.

Mas como pode a jornalista afirmar como fato algo que ainda não foi comprovado? A merendeira é SUSPEITA de ter colocado veneno, ACUSADA de ter colocado veneno, Fátima Bernardes não pode apresentar como fato que a “merendeira pôs veneno de rato na comida de crianças”. Mesmo que haja uma suposta confissão da merendeira, o advogado da acusada afirma que ela não colocou veneno algum e que se apresentará segunda-feira, informação que o Jornal Nacional não traz em sua reportagem. A matéria fere os princípios descritos nos ítens1-v, 1-x, e 1-z dos princípios editoriais, desrespeita o princípio do contraditório e qualquer senso básico de justiça.

A maneira como o jornalismo da Globo lida com suspeitos de crimes é – sob minha ótica – um dos principais desvios éticos da organização. O veículo tem um caráter justiceiro, se coloca acima do judiciário e do devido processo legal, acima do princípio – não descrito no documento da Globo, mas sim na Declaração Universal dos Direitos do Homem – de que todos são inocentes até que se prove o contrário.

A Globo trata suspeitos e investigados como culpados sentenciados, sem autoridade moral ou legal para isso, assume como verdade inequívoca teses não comprovadas de agentes policiais, provocando tragédias como a do calvário do jornalista José Cleves, vítima de uma reportagem sensacionalista do Fantástico em 2001 que – baseado apenas na palavra de um delegado que queria incriminar o jornalista que investigava a corrupção policial – julgou e condenou o réu por antecedência no caso do assassinato de sua esposa. Cleves ficou anos encarcerado, mas posteriormente foi inocentado pelo STF, após intervenção da Comissão Nacional de Direitos Humanos. A matéria do Fantástico havia sido apresentada como prova pela promotoria. O Fantástico nunca se retratou do erro ou citou novamente o nome de Cleves.

Relata José Cleves: “A maldade da polícia, no meu caso, foi reparada pela Justiça, que me absolveu à unanimidade ao acatar a tese de meu advogado de que a arma, apontada pela polícia (e a imprensa que a copiou) como a do crime, fora plantada no local do assalto para incriminar-me. A mesma reparação não tive da imprensa. O espetáculo jornalístico causou um estrago tão grande na minha família que perdi as esperanças de um dia ficar livre desse pesadelo.”


No último domingo uma reportagem de Rodrigo Alvarez para o Fantástico acusava várias pessoas de cometer crimes ambientais na construção de mansões em paraísos ecológicos, a maioria ainda em processo de investigação, mas de maneira hipócrita e corporativista não citou o caso de um funcionário da casa, o apresentador Luciano Huck, condenado por danos ambientais em sua mansão de Angra e processado por outros crimes ambientais no mesmo imóvel.

Outro caso de hipocrisia, agravado pelo recebimento indevido de recursos públicos, se deu na tragédia da região serrana do Rio. Enquanto os editoriais das Organizações Globo responsabilizavam membros do governo federal e estadual por não terem realizado os investimentos para conter as enchentes, escondiam o fato de que a Fundação Roberto Marinho embolsou parte do dinheiro público do Fundo Estadual de Conservação do Meio Ambiente, que deveria ser destinado para a prevenção de enchentes e contenção de encostas, e usou na construção de um museu na área urbana do Rio.


No quesito “correção”, o documento diz que  “Os erros devem ser corrigidos, sem subterfúgios e com destaque. Não há erro maior do que deixar os que ocorrem sem a devida correção”.

Pois bem, a prática de correção de informações equivocadas publicadas pelos veículos da organização é falha. Quando desmenti sozinho quase toda a imprensa brasileira em fevereiro deste ano no “exposé” investigativo “A verdade sobre o Google e a suposta censura de notícias no Brasil“, relatei que após publicar informações falsas, o G1 publicou uma correção que a Agência Estado enviou aos seus clientes depois de alertada pela minha reportagem, mas mantém até hoje a página original sem correção e sem nenhum aviso que as informações ali publicadas não são verdadeiras, e esta página original foi (e ainda é)  usada  como fonte para corroborar uma informação falsa. Na prática, continua publicando mentiras.

O Blog do Noblat, publicação que faz parte das Organizações Globo e que também reproduziu a informação falsa, nunca se seu ao trabalho de corrigi-la e mantém a informação falsa no ar


Outra vez fica claro que o documento das Organizações Globo é apenas uma vaga declaração de intenções, e não um código de conduta.


Uma afirmação do documento que chega a provocar risos é a de que “As Organizações Globo são laicas”. Isso vindo de uma emissora que transmite a “Santa Missa” católica nas manhãs de domingo – sem ônus para o Vaticano – e que trata como fato o “milagre” de Irmã Dulce.

Oremos…